Abaixo o meu conjunto de poemas ganhador do 10º Prêmio Nacional de Poesia – Cidade Ipatinga 2012:
Crônicas breves sobre coisas quase palpáveis
I - Dos dias
segunda-feira
segundo darwin
neste dia
(após descansar
no domingo)
deus desistiu
da sua criação
perfeitinha
e deixou que
as espécies
evoluíssem
por sua
conta
e risco.
terça-feira
dia mais
charmoso
da semana
quando acaba
o transe
e começa
o real
imaginário.
quarta-feira
intervenção
no diário
lâmina de
corte seco
intermediário.
quinta-feira
premonição
do fim
em breve
nascente
poente
de um sol
presdigitado.
sexta-feira
horas
lentas
pessoas
voam
carros
passam
lugares
fecham
vapores
alcoólicos
na camada
de ozônio.
II - Da metrópole
solidão
construtivista
geometrias
assexuadas
avenidas
desertos
sentimentos
terremotos
totens
urbanos
ícones
sob o sol
cinema
suspense
batom
sangrento
bandido/herói
travestis
lâmina com
lâmina
sombras
vorazes
um corpo
que cai
a marca
do zorro
sujeito
oculto
tatuado.
III - De ninguém
neste mundo
de trevas
e tremores
não há povo
que fale
a minha língua
ou entenda
a minha
escrita
nenhuma tribo
que dance
o meu batuque
nenhum pajé
que reze aos
meus deuses
estou sozinho
enquanto ergo
meus totens
em vão
na extensa nudez
das planícies.
IV - Do furto
no povoado cinza
arruinado pelo silêncio
e pela solidão
viveu o poeta blefe
que ganhou fama
e falsa notoriedade
no mundo das letras
no cemitério branco
sobre a colina seca
descansa em paz
o poeta blefe
que furtava sentimentos
de outros poetas já mortos
para construir sua obra
naquele túmulo opaco
o conjunto de ossos
corcomidos
é a sobra da história
do poeta blefe
construída às custas
dos versos de outros
quem passa por aqui
fugindo do destino
ou em busca de silêncio
visita o túmulo imutável
e sempre se indaga sobre
o que levaria um homem
a surrupiar sentimentos
de poetas já mortos.
V – Da infância
nos objetos
da casa
a sensação
de ruídos
a tristeza
imediata
no tormento
que nos
varre
feito o tiroteio
heróico
atrás das cancelas
dos meus
oito anos
ruína sob
ruína
a memória
constrói sua
história torta
ruína sob
ruína
a canção
do exílio
se encerra.
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